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Sessenta anos de Aristides Theodoro O Velho Jagunço

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Escrito por Iracema M. Régis

 

Neste mês de novembro, exatamente no dia 27, o escritor Aristides Theodoro, autodidata, mais conhecido entre os amigos (enchedores de saco, contadores de mentira, que azucrinam todo dia) pela alcunha de “O valho Jagunço”, “O Canalha” ou o “Livreiro Audaz”, completa sessenta anos de jornada, quarenta e tantos dos quais dedicados à literatura. Começando a resenhar livros, ainda rapazote, para “A Gazeta de Santo André”; nessa época já caraminholava poesias e contos ao voltar do serviço a pé, sempre acompanhado dos inseparáveis amigos Moysés Amaro Dalva e Castelo Hanssen. Reside em Mauá há muito tempo, de onde só sairá, segundo suas palavras, para o cemitério.Chamado de “Velho Jagunço”, pela rudeza com que se expressa, ao dar mil e uma informações por dia (na Praça da República, onde trabalha com livros), sem ser pago para isso e sem ouvir aquelas palavras mágicas, que abrem qualquer porta como: com licença, por favor, obrigado, desculpe interromper, etc. Carinhosamente, de “Canalha”, por simples brincadeira, mas tanto esse apelido, quanto o do “Velho Jagunço” estão muito bem retratados no poema “Não Pergunte Nome de Rua Para o Jagunço Moita Brava”, do inveterado poeta sarrista, João Emílio Krauser, vulgo Mad Jack. Leiamos estes versos como ilustração: “O cabra é um lapidado canalha! / Canalha de índole, / canalha de estirpe... / um canalha de pedigree, eu diria. / Mas, sem dúvida, um canalha. O Jagunço Moita Brava não entende de ruas. / O mundo de Moita Brava não tem nome de rua... / Só tem livros, pintura, mentiras e safadezas.” “O Livreiro Audaz” vem de uma crônica do romancista Paulo Dantas, também jagunço, versando sobre a atividade livreira do escritor. Antes, o articulista Severino José, mais conhecido por ser doutor em cordel, escreveu um artigo luminoso, intitulado “Quem Tem Medo de Aristides Theodoro?”, referindo-se à sua cara de bravo, ao seu jeito agressivo de reagir às perguntas imbecis, às suas respostas espinafradas, o que constatam estas frases de seu artigo: “Áspero e aparentemente intratável, como o cacto de Manuel Bandeira. Mas isso não passa de uma máscara. Logo que vencemos este aspecto agressivo de sua personalidade, descobrimos que, por trás da carapaça rude, esconde-se um homem extremamente jovial, apaixonado e entusiasmado pela literatura”. “A falsa agressividade é uma defesa que adquiriu com o passar do tempo, face às perguntas estúpidas que lhe são dirigidas a toda hora e durante todo o dia, por transeuntes mal-educados que ousam interromper os seus agradáveis bate-papos sobre aquilo de que mais gosta, isto é, literatura”.Entretanto, esse mesmo homem relaxa, como se estivesse no divã de um analista, ao encontrar-se com pessoas que, conforme ele afirma, “falam a mesma língua”, ou seja, falam de literatura ou de qualquer outro assunto, de forma democrática, sem a chatice cacete “dos donos da verdade” e dos “monopolizadores” de conversa, fazendo, dos diálogos, tristes e enjoativos “monólogos”. 

 

Esse mesmo homem sente-se “em sua casa”, rodeado de livros e muitos quadros, quando frequenta locais como “O Alpharrabio – Livraria Espaço Cultura”, por ele considerado “A Universidade Livre do ABC Paulista”, um desses lugares que nos engrandecem, um desses ambientes que têm o condão de transformar o homem para melhor.”Aristides Theodoro nasceu em Utinga, no cerne da velha Bahia, “uma pequena cabeça de porco”, como são chamados os lugarejos de pouca expressão, nos cafundós dos brasis.Bem jovem, veio para São Paulo e igual a todo nordestino, somando a desvantagem da cor e da pobreza, enfrentou todos aqueles preconceitos por nós tão conhecidos, como se fosse um estrangeiro dentro da sua própria terra.No começo a família aportou no bairro do Ipiranga, SP. Posteriormente, o pai adquiriu uma propriedade em Mauá, a provinciana cidade da porcelana. Aí foram jogadas as primeiras sementes da literatura, no solo fértil do rapazinho Aristides Theodoro. Sem energia elétrica, à luz de lamparina, lia todas as noites, até altas horas, para a mãe Don’Ana, mulher sem letras, “A Pérola”, de Steinbeck, “O Pequeno Príncipe”, de Saint-Exupèry” e, sobretudo, a Bíblia, carro chefe da casa, de pais protestantes. Ouvia os “causos” fantásticos, origens dos seus contos, narrados pelo pai, o rabugento Cosme Theodoro, falando de onça “montó” (mão torta), das presepadas de valentões, estórias de tabaréus em dias de feira, fantasmas, almas penadas, lobisomem, mula-sem-cabeça, secas e humilhações.O jovem Aristides Theodoro não se contentava em ler e armazenar livros comprados com sacrifício, às expensas do pão-de-cada-dia. 

 

Queria ver o resultado de suas imaginações mirabolantes estampado nas letrinhas miúdas da imprensa. E para perseguir isso teve de lutar, engolir muito sapo. De tanto perseguir o intento, conseguiu publicar pela primeira vez um poema de cunho religioso, no tablóide “O Colibri”, por ele ajudado a fundar, nos primórdios dos anos sessenta. Desde então, passa a escrever sobre autores e livros na Gazeta de Santo André e esporadicamente ocupa espaço numa coluna chamada “A Baronesa”, explorada pelo amigo Castelo Hanssen, no jornal “A Vanguarda” e, mais tarde, em “A Tribuna Popular”, ambas de Santo André.Desse ponto, partiu para as publicações poéticas nas antologias do Colégio Brasileiro de Poetas, de Mauá, do qual é sócio fundador e nos “Cadernos Negros” do Grupo Quilomboje – SP. Resenha livros para a Voz de Mauá e para o Jornal da Manhã, SP. Aristides publicou os seguintes livros: “Dandaluanda”, 1982; “O Poeta Passeia por São Paulo num Sábado à Tarde”, 1991; “Poeminha sem Realismo para Ruth”, 1993; “Não Contribuirei com um só Óbulo para a Construção do Novo Mundo” (Edição resumidíssima), 1997: “Como Preparar Um Diabo Velho em Forno Brando” (em parceria com Iracema M. Régis), 1993 e “Estórias de Curiapeba”, 1996. Tem dois contos publicados no “Cadernos Negros” 20, do Quilomboje, 1997. Eis aí o Aristides Theodoro – sessentão que, com extrema jovialidade, trabalha com afinco em prol das letras nacionais.

 

Jornal da Manhã, 27/11/97

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